domingo, 28 de maio de 2017

OS HERÓIS DE CORDURA

OS HERÓIS DE CORDURA (1959)

Este filme de Robert Rossen é particularmente interessante sob diversos pontos de vista, ainda que não seja dos seus melhores trabalhos. Argumentista com vasta obra, realizador de uma dezena de títulos sempre importantes pela forma como abordou temas fortes com um estilo seguro e eficaz (citam-se, entre outros, “A Hora Decisiva”, “Corpo e Alma”, “A Corrupção do Poder”, “Sangue na Arena”, “Alexandre, o Grande”, “A Vida é um Jogo” ou “Lilith e o Destino”, além deste “Os Heróis de Cordura”), Rossen marcou lugar destacado nas décadas de 40 e 50.  Durante o período da Caça às Bruxas em Hollywood, foi chamado a depor perante a  House of Un-American Activities Committee (HUAC) e recusou-se a revelar nomes de possíveis comunistas. Incluído na lista negra de Hollywood, não trabalhou durante dois anos. A 7 de Maio de 1953 voltou à Comissão e revelou o nome de vários prováveis elementos pertencentes ao PC norte-americano. 
"They Came To Cordura" data de 1959 (posteriormente o realizador criaria talvez as suas duas obras-primas “A Vida é um Jogo” e “Lilith e o Destino”), e aborda um tema muito pouco explorado pelo cinema norte-americano. Creio que se percebe porquê, pois trata-se de matéria delicada para a política internacional dos EUA. Para se perceber melhor o melindre da questão, necessário se torna enquadrar historicamente o episódio relatado.
No inicio do século XX, o México viveu momentos agitados. Passava-se por um ciclo revolucionário que conheceu momentos distintos. Primeiro, o presidente Francisco Madero procurou instituir um regime constitucional, mas, em 1913, o General Huerta conspirou para o assassinar, ao que consta com a cumplicidade de um embaixador dos EUA no México. O presidente norte-americano Woodrow Wilson terá mandando recambiar o embaixador, mas a revolta contra os EUA estalou no México, com muitos mortos e a bandeira injuriada e a confiança em Huerta foi substituída pelo auxílio americano prestado a um tal “Pancho” Villa, violento rebelde dado a bebida e mulheres.  De pouco valeu a mudança táctica, pois pouco depois será o próprio “Pancho” Villa a mudar de campo e a combater os EUA, quando estes o deixaram de apoiar e o trocaram pelo General Venusiano Carranza, que se afirmava constitucionalista. Estamos já em 1916 e o México não ganha a paz. Furioso, Villa resolve dar uma lição aos gringos e invade os EUA, atacando a cidade de Colombus, no New México. Está na hora de serem os EUA, pela batuta do Presidente Wilson, a vingarem a afronta. Exigem ao General Carranza que anule Villa, mas como este nada consegue, manda avançar as tropas norte-americanas para o interior do México, numa intervenção punitiva, sob as ordens do General John J. Pershing. Durante um ano, Pershing tenta apanhar Villa, sem sucesso, sendo então mandado retirar. Sem glória e perante a chacota dos mexicanos. 


O filme de Robert Rossen inicia-se precisamente por esta altura e foca um episódio específico, que é o centro de um romance de Glendon Swarthout, que Ivan Moffat e o próprio Robert Rossen adaptam ao cinema. Gary Cooper interpreta aqui a figura do Major Thomas Thorn, que parte para o México à procura de “heróis”, ou seja militares que se tenham notabilizado por actos de extrema coragem durante os confrontos com as forças mexicanas, para que lhe fosse atribuída a Medalha de Honra. A ideia parece um pouco absurda, mas estávamos na véspera da participação dos EUA na I Guerra Mundial, e estes heróis iriam preparar a opinião pública para a partida do contingente militar para a Europa. Acontece que o Major Thorn esconde no seu passado militar atitudes que não se podem de forma alguma considerar corajosas e a mistura resulta explosiva, quando ele escolhe cinco militares que viu actuar com extrema coragem em vários episódios bélicos por si presenciados. Esses cinco militares, interpretados por actores como Van Heflin, Richard Conte, Michael Callan, Tab Hunter e Dick York, são tudo menos gentlemen e a viagem de regresso a Cordura é uma sucessão de quezílias violentas, com alguns dos militares a oporem-se a serem medalhados, pois o facto trar-lhes-ia mais inconvenientes que vantagens. Depois, além destes seis militares com muito para se recriminarem mutuamente, surge ainda a figura de uma norte-americana que vivia no México, que hospedara guerrilheiros de Villa, e que regressa, também ela contrafeita, aos EUA. Adelaide Geary (Rita Hayworth) provoca igualmente outro tipo de disputa, entre homens sem mulher há meses, sem bebida, sem tabaco, sem água e cada vez mais extenuados por uma viagem alucinante pelas terras tórridas do México. 
O que Robert Rossen procura sobretudo discutir é o conceito de coragem e o seu contrário, a cobardia. Nesse particular, o filme é extremamente interessante e corajoso, abanando os alicerces das convicções mais profundas. Mas para o projecto ser mais conseguido, Rossen deveria ter cortado alguns minutos a esta aventura que se alonga demasiado, muito embora a realização seja intensa e nervosa, e as interpretações magníficas, sobretudo de Gary Cooper e Rita Hayworth, ambos no declínio das suas carreiras, mas ainda em grande forma. 

OS HERÓIS DE CORDURA 
Título original: They Came to Cordura 
Realização: Robert Rossen (EUA, 1959); Argumento: Ivan Moffat, Robert Rossen, segundo romance de Glendon Swarthout; Produção: William Goetz; Música: Elie Siegmeister; Fotografia (cor): Burnett Guffey; Montagem: William A. Lyon; Design de produção: Cary Odell; Direcção artística: Cary Odell; Decoração: Frank Tuttle;  Guarda-roupa: Jean Louis; Maquilhagem: Clay Campbell, Helen Hunt, Armiene, Ben Lane, Robert J. Schiffer; Assistentes de realização: Carter De Haven Jr., Milton Feldman, James Curtis Havens, R. Robert Rosenbaum, David Salven, Roger Slager; Departamento de arte: Ray Bassell, Irving Goldfarb, Edward Goldstein, Harry Hopkins, David Horowitz; Som: John P. Livadary, George Cooper, Sol Jaffe, Harold Lee, Ernest Reichert, George Roncon; Departamento de arte: Columbia Pictures Corporation, A Goetz-Baroda Production, A Goetz-Baroda Production; Intérpretes: Gary Cooper (Major Thomas Thorn), Rita Hayworth (Adelaide Geary), Van Heflin (Sgt.John Chawk), Tab Hunter (Lt. William Fowler), Richard Conte (Cpl. Milo Trubee), Michael Callan (Pvt. Andrew Hetherington), Dick York (Pvt. Renziehausen), Robert Keith (Colonel Rogers), Carlos Romero (Arreaga), Jim Bannon (Capt. Paltz), Edward Platt, Maurice Jara, Sam Buffington, Arthur Hanson, Clem Fuller, Wendell Hoyt, Maggie, etc. Duração: 123 minutos; Distribuição em Portugal: Columbia; Tristar; Classificação etária: M/ 12 anos. 

GARY COOPER 
(1901-1961)
Frank James Cooper nasceu a 7 de Maio de 1901, em Helena, Montana, EUA, e viria a falecer a 13 de Maio de 1961, em Beverly Hills, Los Angeles, Califórnia, EUA, com 60 anos, vítima de um cancro na próstata. Casado com uma única mulher, Sandra Shaw (1933-1961), contam-se, no entanto, várias ligações extramatrimoniais, com actrizes e personalidades muito conhecidas. 
Era filho de Charles Henry Cooper, inglês, advogado, que deixou Inglaterra aos 19 anos e se tornou juiz do Supremo Tribunal do Estado de Montana, antes de comprar um rancho e se dedicar inteiramente à agricultura (“o meu pai era um verdadeiro Westerner”, conta Gary Cooper). Em 1910, o jovem Cooper viaja com a mãe até Inglaterra e, na volta, apaixona-se igualmente pela vida de rancheiro. Foi guia no Yellowstone Park. Na universidade, teve os primeiros contactos com a arte de representar e deixou-se sucumbir aos encantos de Hollywood, para onde partiu, inicialmente para se ocupar em pequenos papéis de figuração. O seu primeiro trabalho “visível” terá sido em 1926, em “The Winning of Barbara Worth” (A Flor do Deserto), de Henry King. A partir daí, interveio em mais de uma centena de obras, muitas das quais como protagonista, sendo um dos mais requisitados actores de Hollywood, sobretudo no campo do western. Ícone de várias gerações, que viam nos seus olhos claros o reflexo de um herói sem mácula, Gary Cooper possuiu uma carreira marcada por grandes sucessos, que se podem consultar na sua filmografia. Ernest Hemingway, por exemplo, achou que Gary Cooper tinha sido o actor ideal para interpretar as adaptações de dois dos seus romances mais célebres: “O Adeus às Armas” (1932) e “Por Quem os Sinos Dobram” (1943). 
Politicamente era conservador, foi chamado à Comissão de Actividades Anti-Americanas e não revelou qualquer nome, defendeu Carl Foreman, enquanto argumentista de “High Noon” e pediu a John Wayne, que acusara o filme de “anti-americano”, para receber o Oscar de Melhor Actor em seu nome.  Ganhou dois Oscars, com “Sergeant York” (1941) e “High Noon” (1952) e foi nomeado mais três vezes, com “Mr. Deeds Goes to Town” (1936), “The Pride of the Yankees” (1942) e “For Whom the Bell Tolls” (1943). Recebeu ainda, em 1961, um Óscar Honorário pelo conjunto da obra. Em 1999, na lista organizada pelo American Film Institute, Gary Cooper era considerado o 11º melhor actor de todos os tempos. 
Em 1960, foi operado por duas vezes para retirar um cancro na próstata e no cólon. Julgado curado, no ano seguinte foi acometido de fortes dores no pescoço e no ombro, quando filmava em Inglaterra, e descobriu que a doença se havia se espalhado para os pulmões e os ossos. Não fez qualquer tratamento específico e faleceu pouco depois, aos 60 anos de idade. Encontra-se sepultado em Sacred Hearts of Jesus & Mary R.C. Cemetery, no Condado de Suffolk, Nova Iorque EUA. 

Filmografia / no cinema (principais filmes): 1923: The Last Hour, de Edward Sloman; 1925: The Eagle (A Águia Negra), de Clarence Brown; 1926: The Winning of Barbara Worth (A Flor do Deserto), de Henry King; 1927: Wings (Asas), de William A. Wellman; 1928: The Legion of the Condemned (A Legião dos Condenados) de William A. Wellman ; 1929: The Virginian, de Victor Fleming; 1930: Morocco (Marrocos), de Josef von Sternberg; 1931: Fighting Caravans (Os Civilizadores), de Otto Brower e David Burton; City Streets (Ruas da Cidade), de Rouben Mamoulian; 1932: If I Had a Million (Se Eu Tivesse Um Milhão), de Ernst Lubitsch e Norman Z. McLeod; A Farewell to Arms (O Adeus às Armas), de Frank Borzage; 1933: Today We Live (A Vida é o Dia de Hoje), de Howard Hawks; Alice in Wonderland (Alice no País das Fadas), de Norman Z. McLeod; Design for Living (Uma Mulher para Dois), de Ernst Lubitsch; 1934: Now and Forever (Sou Tua para Sempre), de Henry Hathaway; 1935: The Lives of a Bengal Lancer (Lanceiros da Índia), de Henry Hathaway; The Wedding Night (Noite de Pecado), de King Vidor; Peter Ibbetson (Sonho Eterno), de Henry Hathaway; 1936: Desire (Desejo), de Frank Borzage; Mr. Deeds Goes To Town (Doido com Juízo), de Frank Capra ; The General Died at Dawn (O General Morreu ao Amanhecer), de Lewis Milestone; The Plainsman (Uma Aventura de Buffalo Bill), de Cecil B. DeMille; 1937: Souls At Sea (Almas em Perigo), de Henry Hathaway; 1938: Blue Beard's Eighth Wife (A Oitava Mulher do Barba Azul), de Ernst Lubitsch; The Adventures of Marco Polo (As Aventuras de Marco Polo), de Archie Mayo; 1939: Beau Geste (Beau Geste), de William A. Wellman; The Real Glory (A Verdadeira Glória), de Henry Hathaway; 1940: The Westerner (A Última Fronteira), de William Wyler; North West Mounted Police (Os Sete Cavaleiros da Vitória), de Cecil B. DeMille;1941: Meet John Doe (Um João Ninguém), de Frank Capra; Sergeant York (Sargento York), de Howard Hawks; Ball of Fire (Bola de Fogo), de Howard Hawks; 1942: The Pride of the Yankees (O Ídolo), de Sam Wood; 1943: For Whom The Bell Tolls (Por Quem os Sinos Dobram), de Sam Wood; 1944: The Story of Dr. Wassell (Pelo Vale das Sombras), de Cecil B. DeMille; Casanova Brown (O Moderno Casanova), de Sam Wood; 1945: Along Came Jones (Aí Vem Ele), de Stuart Heisler; Saratoga Trunk (Saratoga), de Sam Wood; 1946: Cloak and Dagger (O Grande Segredo), de Fritz Lang; 1947: Unconquered (Inconquistáveis), de Cecil B. DeMille; 1948: Good Sam (O Bom Samaritano), de Leo McCarey; 1949: The Fountainhead (Vontade Indómita), de King Vidor; Task Force (A Última Batalha), de Delmer Daves; 1950: Bright Leaf (Fumos da Ambição), de Michael Curtiz; Dallas (A Paz voltou à Cidade), de Stuart Heisler; 1951: You're in the Navy now (Marinheiros de Água Doce), de Henry Hathaway; It's a Big Country, de Clarence Brown, Don Hartman, John Sturges, Richard Thorpe, Charles Vidor, Don Weis e William A. Wellman; : Distant Drums (As Aventuras do Capitão Wyatt), de Raoul Walsh; 1952: High Noon (O Comboio Apitou Três Vezes), de Fred Zinnemann; Springfield Rifle (Missão Secreta), de André De Toth; 1953: Blowing Wild (Vento Selvagem), de Hugo Fregonese; 1954: Garden of Evil (O Jardim do Diabo), de Henry Hathaway; Vera Cruz (Vera Cruz), de Robert Aldrich; 1955: The Court Martial of Billy Mitchell (Conselho de Guerra), de Otto Preminger; 1956: Friendly Persuasion (Sublime Tentação), de William Wyler; 1957: Love in the Afternoon (Ariane), de Billy Wilder; 1958: Man of the West (O Homem do Oeste), de Anthony Mann; The Hanging Tree (Raízes de Ouro), de Delmer Daves; 1959: They Came To Cordura (Os Heróis de Cordura), de Robert Rossen; The Wreck of the Mary Deare (O Mistério do Navio Abandonado), de Michael Anderson; 1960: The Nacked Edge (O Gume da Navalha), de Michael Anderson.

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