quarta-feira, 9 de novembro de 2016

O PADRINHO


O PADRINHO (1972)


Vi “O Padrinho” na sua estreia em Portugal, em Outubro de 1972, creio que o revi pouco anos depois, e voltei a vê-lo agora, numa cópia Blu-ray, para escrever este texto. Também escrevi sobre o filme aquando do seu lançamento e não costumo lamentar escritos antigos meus. Neste caso, tenho de dar a mão à palmatória. Foi um dia mau, o meu, ao ver e analisar o filme, muito preocupado com o que a publicidade excessiva faz aos filmes, e não dando suficiente importância à obra em si. Por essa altura já alguns exaltados diziam que era “o melhor filme de sempre”, no que não concordava na altura nem agora, mas os meus comentários limitavam de alguma forma as qualidades desta realização de Francis Ford Coppola que, presentemente, não tenho dúvidas em classificar de obra-prima.
Antes de “O Padrinho”, Coppola tinha realizado filmes interessantes, mas sem nada que neles autorizasse supor a existência de um génio. “Demência 13” (1963), “A Noite é Perversa”, “O Vale do Arco-Íris”, “Chove no Meu Coração” (1969) não permitiam antever o que viria depois. Desde logo a trilogia “O Padrinho”, em cinema e televisão, mas igualmente títulos tão importantes como “O Vigilante”, “Apocalypse Now”, “Do Fundo do Coração”, “Os Marginais”, “Juventude Inquieta”, “Cotton Club”, “Peggy Sue Casou-se”, “Jardins de Pedra”, “Tucker - O Homem e o Seu Sonho”, “Drácula de Bram Stoker”, “O Poder da Justiça”, ou “Tetro” (2009), último título seu até hoje que nos entusiasmou.
A partir de “O Padrinho”, Coppola assume-se como um dos grandes cineastas do moderno cinema norte-americano, com uma obra de um fôlego dramático, em simultâneo de um classicismo e de um arrojo formal que surpreendem e fascinam.
Em “The Godfather” não sei que mais enaltecer, se a inteligência e lucidez do argumento, se a magnificência e subtileza da realização, se o espantoso trabalho de actores com que nos deparamos, se a qualidade técnica e artística da fotografia, da direcção artística, do guarda roupa, da música, enfim de todos os aspectos desta magnífica orquestra a funcionar em uníssono para um fim desejado.



Tudo se passa em meados dos anos 40, terminada a II Guerra Mundial. Em Nova Iorque e na zona que rodeia a metrópole, algumas famílias da Mafia disputam o poder e a influência que lhes permitam multiplicar os lucros. Estamos numa época de mudança. Os antigos gangsters dos anos 30 estavam a desaparecer e a dar lugar a novos empórios com novas filosofias de sobrevivência. Uma dessas famílias, talvez a mais poderosa e a mais invejada, era a de Don Corleone (Marlon Brando), que funcionava à moda antiga, que preferia controlar o jogo, as bebidas, as mulheres, a prostituição e o proxenetismo, do que alinhar na droga, que se adivinhava surgir em força. Dom Corleone, contudo, tem um “rigoroso código moral” e não aceita esse negócio de drogas que lhe é proposto, recusando viciar a juventude. Mais tarde outros irão aceitar as regras, desde que as drogas duras sejam vendidas sobretudo “a pretos e latinos”.
Mas é a recusa inicial de Don Corleone que irá lançar os vários gangs de mafiosos uns contra os outros, culminando tudo isto com um massacre desapiedado, no meio do qual desaparece não só Dom Corleone, como familiares, e muitos dos seus principais colaboradores e adversários. Quando a dinastia dos Corleone parece à beira do total colapso, eis que um novo “padrinho” surge no horizonte com processos bem mais “modernos”, muito mais de acordo com o tipo de iniciativas actuais. 0 novo Corleone (Al Pacino) irá então triunfar onde o velho estilo do gangster de Chicago dos anos 30 tinha já naufragado. Curioso, no entanto, notar que o novo “padrinho” surge de início como o descendente que mais longe se encontra de poder prosseguir a obra do pai, sendo, aliás, cuidadosamente afastado de todos os negócios menos claros. Porque ele era a face legal, a honra da família, o brilhante representante de uma aculturação intensa, que estudara, servira no exército, fora condecorado por actos heroicos. Ele era o homem que a família conseguira introduzir dentro do sistema americano, que a própria América homenageara. Parece-nos este um dos aspectos mais curiosos do filme de Coppola ao documentar este confronto entre duas mentalidades, uma que entra em declínio, enquanto outra ascende vertiginosamente ao poder, mostrando igualmente como os seus métodos violentos se mantêm, mas com novas nuances, com matizes diversos nos seus processos de luta pelo poder. 
Neste particular, toda a sequência (montada em paralelo) de um baptizado e de uma chacina é obviamente elucidativa dos novos métodos que iludem a agressividade de outrora. A este respeito, outros se lhe poderão acrescentar, desde a análise de uma situação dominada por um paternalismo ditatorial (a figura de Don Corleone - Marlon Brando justifica as suas acções por uma aparente “rectidão moral” e por uma obediência a preceitos de justiça e regras de moralidade muito próprias, de que facilmente se descobre a falência), até ao desenho de uma época, passando pelo jogo de interesses que grupos clandestinos conseguem sustentar com altas individualidades do poder administrativo e legislativo americanos (senadores, juízes, juristas, polícia, etc.). No interior deste longo painel de uma sociedade viciada pelo crime e pela corrupção, iremos ainda encontrar referências directas a individualidades reconhecíveis, caso do “cantor-actor” que tudo parece indicar tratar-se de Frank Sinatra, nos tempos em que este andava por baixo e terá sido a influência de algum “padrinho” que lhe conseguiu o papel em “Até à Eternidade” que o voltaria a catapultar para a glória, incluindo com a atribuição de um Oscar que algumas más línguas (quem sabe?) afirmam ter sido igualmente conquistado com a interferência da Mafia.



Neste aspecto, o filme de Coppola é terrivelmente eficaz na crítica e no desmontar dos esquemas montados para assegurarem o progresso económico das “famílias” que trocam favores em todos os escalões sociais da sociedade certificando-se que para todos os problemas se encontram “soluções”. “O Padrinho” fala da Mafia nos anos 40, nos EUA. Será que o que então aí se passava já pertence ao passado? Em grande parte, é claro que sim. Os métodos são hoje em dia muito mais higienizados, mas não menos violentos. E as “famílias” diversificaram-se. Hoje não são só os sicilianos, a corrupção instala-se um pouco por todo o lado, e tudo se faz para se esconder os processos nada lícitos de enriquecer. É difícil hoje falar-se de um padrinho, quando eles proliferam a todos os níveis. Só na América? Infelizmente, o que nos dizem os factos é que os padrinhos não têm pátria. Tudo se sabe numa democracia? “O Padrinho” também nos mostra como se cozinham as notícias, com jornalistas comprados que escrevem o que convém a determinada personalidade ou grupo. Sobretudo como destruir socialmente alguém que não nos interessa que tenha boa fama. O caso do capitão da polícia que é pago enquanto serve os interesses, mas de quem depois se descobrem os podres, para arruinar a reputação é exemplar. Veja-se inclusive como esses podres são conservados em banho-maria enquanto a figura dá jeito e cumpre as tarefas para que é paga, bem paga aliás, e como eles saltam para as paragonas dos jornais quando se torna necessário.
Uma obra bem elaborada na origem, pensada, estruturada, rica de implicações e significados, subtil no que tenta fazer passar, é obviamente uma obra que exige no acto de desfrute a mesma atenção e critério, a mesma complexidade de análise, a exploração de caminhos diversos. “O Padrinho” é um manancial de interpretações possíveis. Atente-se na figura de Don Corleone (Marlon Brando). Este chefe da Mafia é um exemplo de ditador político, que baseia o seu poder na célula familiar, mesmo quando não existem laços desse género. Quando assim é, eles toram-se protegidos do “padrinho”, pedem favores e ficam à espera que os mesmos sejam pagos. Tecem-se assim teias de influências secretas a que se lança mão quando necessário. O filme começa, aliás, com uma cena absolutamente notável, com um pedido de favor, na obscuridade da sala privada de Don Corleone, onde este explica as regras de conduta. Subordinação completa ao seu poder, se pretende um favor que será conferido de imediato. Mais tarde, o penitente cumprirá o reverso da medalha, como dono de uma funerária. Mas esta cena é ainda importante para definir o papel da América como terra prometida, paraíso para os italianos que a demandam há séculos. Veja-se como este filme de Coppola anda à volta apenas de italianos, italo-americanos e americanos brancos. Esta é a sociedade que importa para o “padrinho”. É neste círculo que estabelece as regras, que as faz cumprir, que negoceia em paridade, que aceita misturas raciais. O padrinho governa esta sociedade fechada, numa ordem corporativa, dirigida de forma paternalista (O chefe sabe o que é melhor para todos e impõe esse saber). A Mafia poderá estar na base de algumas formas ditatoriais, como o fascismo italiano ou a ditadura corporativa e paternalista de Salazar. 



Esta história que Francis Ford Coppola escreveu de colaboração com Mario Puzo, o autor do romance de onde tudo parte, mostra-se ainda curiosa de um outro ponto de vista. Claro que a visão dos responsáveis por este projecto é crítica. Mas não deixa de existir um certo fascínio por esta sociedade patriarcal, com regras muito definidas e uma defesa intransigente da família. O próprio Coppola dirige este empreendimento como um chefe de família, fazendo participar nele toda a família, desde o pai, irmã, filhos, demais parentes. Olhando para as fotografias de rodagem, o ambiente é igualmente de fraterna criatividade. Não esquecer, portanto, que Coppola é de origem italiana, o que fica bem demonstrado ao longo de toda a sua filmografia. A empatia com os costumes italianos está bem patente nesse fabuloso casamento inicial, uma das sequências absolutamente inesquecíveis deste filme, bem como o baptismo que virá depois. Em ambas as sequências a vida é aclamada ao ar livre, na luminosidade do dia, enquanto os negócios sujos se projectam no interior de gabinetes escusos, sombrios, que facilmente se associam a velórios. Há inclusive uma cena de refeição que mostra como os negócios devem ser conduzidos longe da esfera familiar, longe das mulheres e das crianças. À mesa não se fala de negócios, é uma norma que urge preservar. 
“O Padrinho” mostra como os traidores são tratados, como os corruptos têm a sorte que merecem, como os leais são favorecidos, e nunca se mostra o reverso da medalha, o que está por detrás desta família organizada em função do crime: não há prostitutas na rua ou em bordeis, não há vítimas de bebida ou de jogo, nem sequer se vê a droga a progredir no tecido social. O que assistimos é a uma visão interior, íntima, familiar em torno de um desses imperadores da Mafia na América de 40. Na já aludida conversa inicial, o dono de uma funerária pede justiça para a filha que “perdeu a honra” nos braços de um jovem. Ele pretende justiça. Don Vito pergunta-lhe porque só veio agora. “Fui à polícia, como um bom americano”. “Porque foi à polícia e não veio ter comigo logo?”, pergunta o padrinho. A confirmação de que existem duas sociedades, dois poderes, duas justiças justapostas.
Voltando à cena do casamento inicial, veja-se a mestria de Coppola a desenhar figuras e situações. Existem várias personagens essenciais ao desenrolar da intriga futura. Em meia dúzia de planos elas são descritas nos seus traços fundamentais. De Don Vito Corteone até ao mais insignificante secundário que ensaia no exterior o pequeno diálogo que irá manter com o padrinho no interior. Esta largueza de desenho, esta minucia de caracterização são constantes ao longo de toda a obra. Partindo do argumento, esmera-se na realização, prolonga-se nos diferentes sectores técnicos, da direcção artística, a fotografia, à música (que Coppola divide pelo felliniano Nino Rota e pelo próprio pai, Carmine Coppola, que aparece no filme a tocar piano), até culminar no fabuloso elenco, magistralmente dirigido. Marlon Brandon é genial como (quase) sempre, muito embora a caracterização me continue a parecer algo excessiva, passando por Al Pacino, James Caan, Robert Duvall, Sterling Hayde, John Cazale, Diane Keaton, Richard Conte até aos actores menos conhecidos, mas todos eles brilhantes, Al Lettieri, Abe Vigoda, Talia Shire, Gianni Russo, Rudy Bond, Al Martino, Richard S. Castellano, John Marley, entre tantos outros. 




O PADRINHO
Título original: The Godfather
Realização: Francis Ford Coppola (EUA, 1972); Argumento: Francis Ford Coppola, Mario Puzo, Segundo romance de Mario Puzo ("The Godfather"); Produção: Gray Frederickson, Albert S. Ruddy, Robert Evans; Música: Nino Rota; Fotografia (cor): Gordon Willis; Operador de câmara: Michael Chapman; Montagem: William Reynolds, Peter Zinner; Casting: Louis DiGiaimg, Andrea Eastman, Fred Roos, Riccardo Bertoni; Design de produção: Dean Tavoularis; Direcção artística: Warren Clymer; Decoração: Philip Smith; Guarda-roupa: Anna Hill Johnstone, George Newman, Marilyn Putnam, Joan Joseff; Maquilhagem: Philip Leto, Phil Rhodes, Dick Smith; Direcção de Produção: Fred C. Caruso, Valerio De Paolis,Ned Kopp; Assistentes de realização: Tony Brandt, Fred T. Gallo, Stephen F. Kesten, Steven P. Skloot; Departamento de arte: William Canfield, Robert Hart, Robert Scaife; Som: Charles Grenzbach, Christopher Newman, Richard Portman; Efeitos especiais: Sass Bedig, A.D. Flowers, Joe Lombardi, Paul J. Lombardi; Efeitos visuais (restauro, 2007): Kevin Chaja, Padraic Culham, Daphne Dentz, Karina Desin, Bill Roper, etc. Companhias de produção: Paramount Pictures, Alfran Productions; Intérpretes: Marlon Brando (Don Vito Corleone), Al Pacino (Michael Corleone), James Caan (Sonny Corleone), Richard S. Castellano (Clemenza), Robert Duvall (Tom Hagen), Sterling Hayde (Capt. McCluskey), John Marley (Jack Woltz), Richard Conte (Barzini), Al Lettieri (Sollozzo), Diane Keaton (Kay Adams), Abe Vigoda (Tessio), Talia Shire (Connie), Gianni Russo (Carlo), John Cazale (Fredo), Rudy Bond (Cuneo), Al Martino (Johnny Fontane), Morgana King (Mama Corleone), Lenny Montana (Luca Brasi), John Martino, Salvatore Corsitto, Richard Bright, Alex Rocco, Tony Giorgio, Vito Scotti, Tere Livrano, Victor Rendina, Jeannie Linero, Julie Gregg, Ardell Sheridan, Simonetta Stefanelli, Angelo Infanti, Corrado Gaipa, Franco Citti, Saro Urzì, Chris Anastasio, Norm Bacchiocchi, Max Brandt, Tybee Brascia, Carmine Coppola (pianist), Gian-Carlo Coppola (no baptizado), Italia Coppola (Extra), Roman Coppola (rapaz no passeio a ver passar o funeral), Sofia Coppola (Michael Francis Rizzi), Don Costello (Don Victor Stracci), Robert Dahdah, Richard Fass, Gray Frederickson, Ron Gilbert, Anthony Gounaris, Joe Lo Grippo, Sonny Grosso, Louis Guss, Merril E. Joels, Randy Jurgensen, Tony King, Peter Lemongello, Tony Lip, Frank Macetta, Lou Martini Jr., Raymond Martino, Joseph Medaglia, Carol Morley, Rick Petrucelli, Joe Petrullo, Burt Richards, Sal Richards, Tom Rosqui, Nino Ruggeri, Frank Sivero, Filomena Spagnuolo, Joe Spinell, Gabriele Torrei, Nick Vallelonga, Ed Vantura, Ron Veto, Matthew Vlahakis, Conrad Yama, etc. Duração: 175 minutos; Distribuição em Portugal: Lusomundo Filmes / Paramount Pictures; Classificação etária: M/ 17 anos (posteriormente: M/ 18 anos); Data de estreia em Portugal: 24 de Outubro de 1972.


MARLON BRANDO (1924 - 2004)
Considerado por muitos como “o melhor actor de cinema de todos os tempos”, Marlon Brando, que revolucionou decididamente as artes dramáticas nos Estados Unidos com suas actuações em “Um Eléctrico Chamado Desejo”, em 1951, e “Há Lodo no Cais”, em 1954, e que, depois, em 1972, criaria a mítica personagem de Don Vito Corleone em “O Padrinho”, morreu aos 80 anos, num hospital de Los Angeles.
Foi, desde o início da carreira no cinema, no princípio da década de 50, um actor que deu corpo e alma a um tipo de herói americano por excelência. Na América individualista, há vários géneros de heróis, do “self made man” vencedor, que faz a imagem dos Estados Unidos triunfalistas, ao anti-herói amargurado por dúvidas, com ou sem causas a defender, sacrificado e mortificado por uma sociedade desapiedada, onde só os mais fortes e sem escrúpulos triunfam. Antes de Marlon Brando, tinha havido já ensaios tímidos desta personagem, com actores como John Garfield, depois dele alguns outros surgiram a dar corpo a essa imagem, como James Dean, Montgomery Clift, Paul Newman ou Steve McQueen. Mais recentemente, Sean Penn ou Leonardo di Caprio podem ser dados como sucessores da dinastia. São sedutores inatos, personagens românticas, almas transviadas, perdidas, incapazes de segurar momentos de perfeição ou plenitude. Momentos que atravessam, para se perderem logo a seguir, num ímpeto de rebeldia, num acesso de independência gratuita, que apenas procura marcar uma atitude.
Marlon Brando teve uma infância infeliz. Mas onde é que já se leu esta frase adaptada a actores norte-americanos, daqueles que para sempre marcaram a história do teatro e do cinema mundiais? Nasceu em Omaha, no Estado do Nebraska, a 3 de Abril de 1924, numa família que mesclava as suas origens irlandesas com antepassados franceses e ingleses. Chamavam-se originalmente Brandeau.
O pai, de nome Marlon Brando, era um vendedor de carbonato de cálcio e a mãe, cujo nome de solteira era Dorothy Pennebaker, trabalhava no Teatro Comunitário de Omaha, onde ocasionalmente era actriz. Foi ela quem levou Marlon Brando ao teatro pela primeira vez. Era um rapaz rebelde e o pai mandou-o para uma escola militar, a Shattuck Military Academy, em Fairbult, Minnesota, para o disciplinar, mas foi rapidamente expulso. Voltou a casa, por uns tempos, mas aos 19 anos mudou-se para Nova Iorque, dividindo um apartamento com sua irmã Frances. Era a independência. O gosto da liberdade, que não mais deixou de perseguir. Na academia militar, apenas um professor de inglês que também encenava peças de teatro, manifestara optimismo na carreira futura de Brando. Quando saiu da escola, despediu-se dele com um reconfortante “o mundo ainda há-de ouvir falar de ti!” Como só o tinham elogiado no teatro, pensou: “Vou ser actor!”
Em 1943, Brando inscreve-se num curso de teatro dirigido pelo emigrante alemão Erwin Piscator. Frequentou o Dramatic Workshop da New School for Social Research, tendo como professora Stella Adler, que vivera em Moscovo na década de 30 e estudara e trabalhara com Konstantin Stanislavsky no Teatro das Artes de Moscovo. Na América, animou o Group Theatre que usava o “método” de Stanislavsky, segundo o qual cada actor tinha de alimentar as personagens que criava com as emoções da sua própria personalidade. Marlon Brando sempre esteve mais próximo de Stella Adler do que do outro seguidor do método, Lee Strasberg, de quem, aliás, se distanciou tempos mais tarde, acusando-o de oportunismo e muito mais.
Em 1944 aparece na Broadway, na obra – não musical - de Rodgers and Hammerstein "I Remember Mama", que esteve dois anos em cena. Em 1946, Brando interpreta o drama de Maxwell Anderson “Truckline Café”, dirigido por Elia Kazan, o mesmo encenador que lhe daria o papel de Kowalski em “Um Eléctrico Chamado Desejo”, em 1947. A personagem do brutal marido de Stella na obra-prima de Tennessee Williams, que interpretou durante dois anos na Broadway, lança-o definitivamente no sucesso.
Entretanto, estreia-se no cinema em 1950, em “The Men”, de Fred Zinnemann, ao lado de Teresa Wright, num papel que à partida não se imaginaria entregue ao recém-criado “sex symbol” que apaixonara Nova Iorque no teatro. Mas a verdade é que Brando é um paraplégico, preso a uma cama ou a uma cadeira de rodas. Foi o início de uma carreira brilhante, com algumas dezenas de filmes inesquecíveis.


Filmografia
1. Como Actor: 1950: The Men ou “Battle Stripe” (O Desesperado), de Fred Zinnemann; 1951: A Streetcar Named Desire (Um Eléctrico Chamado Desejo), de Elia Kazan; 1952: Viva Zapata! (Viva Zapata!), de Elia Kazan; 1953: Julius Caesar ou “William Shakespeare's Julius Caesar” (Júlio César), de Joseph L. Mankiewicz; 1953: The Wild One (O Selvagem), de László Benedek; 1954: On the Waterfront (Há Lodo No Cais), de Elia Kazan; 1954: Desirée (Desirée, O Primeiro Amor de Napoleão), de Henry Koster; 1955: Guys and Dolls (Eles e Elas), de Joseph L. Mankiewicz; 1956: The Teahouse of the August Moon (A Casa de Chá do Luar de Agosto), de Daniel Mann; 1957: Sayonara (Sayonara), de Joshua Logan; 1958: The Young Lions (Os Jovens Leões), de Edward Dmytryk; 1959: The Fugitive Kind (O Homem na Pele da Serpente), de Sidney Lumet; 1961: One-Eyed Jacks (Cinco Anos Depois), de Marlon Brando; 1962: Mutiny on the Bounty (Revolta na Bounty), de Lewis Milestone, Carol Reed (não creditado); 1963: The Ugly American (Sua Excelência, o Embaixador), de George Englund; 1964: Bedtime Story (Os Sedutores), de Ralph Levy; 1965: Morituri ou “The Saboteur, Code Name Morituri” (Morituri), de Bernhard Wicki; 1966: The Chase (Perseguição Impiedosa), de Arthur Penn; 1966: The Appaloosa ou “Southwest to Sonora” (Um Homem sem Medo), de Sidney J. Furie; 1967: A Countess from Hong Kong (A Condessa de Hong Kong), de Charles Chaplin; 1967: Reflections in a Golden Eye (Reflexos num Olho Dourado), de John Huston; 1969: Queimada (Queimada), de Gillo Pontecorvo; 1972: The Nightcomers (Os Perversos), de Michael Winner; 1972: The Godfather (O Padrinho), de Francis Ford Coppola; 1972: Ultimo Tango a Parigi ou “Last Tango in Paris” ou “Le Dernier Tango à Paris” (O Último Tango em Paris), de Bernardo Bertolucci; 1976: The Missouri Breaks (Duelo no Missouri), de Arthur Penn; 1978: Superman ou “Superman: The Movie” (Super-Homem, o Filme), de Richard Donner; 1979: Apocalypse Now (1979) Apocalypse Now Redux (2001) (Apocalipse Now e Apocalipse Now Redux), de Francis Ford Coppola; 1979: Roots: The Next Generations (Raizes: A Próxima Geração), de Lloyd Richards, John Erman, Charles S. Dubin, Georg Stanford Brown (mini-série para TV); 1980: The Formula (A Fórmula), de de John G. Avildsen; 1989: A Dry White Season (Assassinato Sob Custódia), de Euzhan Palcy; 1990: The Freshman (O Caloiro da Máfia), de Andrew Bergman; 1992: Christopher Columbus: The Discovery (Cristovão Colombo: A Descoberta), de John Glen; 1992: The Godfather Trilogy (O Padrinho – A Trilogia), de Francis Ford Coppola; 1995: Don Juan DeMarco (Don Juan de Marco), de Jeremy Leven; 1996: The Island of Dr. Moreau (A Ilha do Dr. Moreau), de John Frankenheimer, Richard Stanley (não creditado, despedido e substituído por John Frankenheimer); 1997: The Brave (O Bravo), de Johnny Depp; 2001: The Score (Sem Saída), de Frank Oz, Robert De Niro (não creditado); 2006: Big Bug Man, de Bob Bendetson, Peter Shin;
2. Como Realizador: 1961: One-Eyed Jacks (Cinco Anos Depois), de Marlon Brando.


AL PACINO (1940 - )
Alfredo James Pacino, mais conhecido por Al Pacino, nasceu em Nova Iorque (East Harlem), a 25 de Abril de 1940), filho de italo-americanos, Salvatore Pacino e Rose, que se divorciaram quando ele tinha dois anos. A mãe mudou-se para próximo do Zoológico do Bronx para morar com seus pais, que, curiosamente, eram provenientes de uma pequena cidade siciliana de nome Corleone. O pai viajou para Covina, na Califórnia, onde trabalhou em seguros e como proprietário de um restaurante. "Sonny", como era conhecido pelos amigos, pensava vir a ser jogador de basebol, mas abandonou a escola aos 17 anos e fugiu de casa. Empregou-se como mensageiro, empregado de correios e finanças, com o que conseguiu pagar as aulas de interpretação. Era tido como problemático e arruaceiro. Começou a fazer teatro, em teatro de amador, em garagens, tentou o Actors Studio, mas foi rejeitado. Acabou por ingressar no Herbert Berghof Studio (HB Studio), onde foi aluno de Charlie Laughton (nada a ver com actor Charles Laughton), que se tornou seu mentor e melhor amigo. Em finais dos anos 60, estuda sob a orientação de Lee Strasberg, o que funcionou igualmente como terapia para os seus problemas de juventude rebelde, causados pela pobreza e o meio opressor onde vivia. Começou a trabalhar no teatro profissional, e o talento foi reconhecido. Ganhou um Obie Award pela sua interpretação em “The Indian Wants the Bronx” e um Tony Award por “Does the Tiger Wear a Necktie?”. O seu primeiro trabalho no cinema data de 1969, “Me Natalie”. Em 1971, com o seu trabalho “The Panic in Needle Park”, ganhou notoriedade e chamou a atenção de Francis Ford Coppola, que lhe entrega o papel de Michael Corleone no filme “The Godfather”, de 1972. Com ele recebeu a primeira nomeação para o Oscar de Melhor Actor secundário. Dois anos depois, somaria outra nomeação, agora como Melhor Actor, em “The Godfather: Part II”. Só em 1993 Al Pacino conseguiria alcançar o Oscar, com o seu trabalho em “Scent of a Woman”. No mesmo ano, foi também nomeado novamente como Melhor Actor Secundário, em “Glengarry Glen Ross”. A sua carreira vive um período de ouro, com intervenções em filmes notáveis. A década de 1980 não lhe foi tão favorável, integrando alguns fracassos (“Cruising” ou “Author! Author!”), apesar de o manter em bom nível, por exemplo em “Scarface”, onde volta a ser premiado nos Globos de Ouro. Em “Revolution”, de 1985, tem a que é considerada uma das suas piores interpretações, mas regressa no final na década em “Sea of Love”, mantendo as excelentes interpretações em obras comoSerpico”, “Dog Day Afternoon”, “...And Justice for All”, “Carlito’s Way”, “Heat”, “Donnie Brasco” ou “The Recruit”.
Em simultâneo, nunca abandonou o teatro, sendo frequente encontrá-lo nos palcos da Broadway (e também off-Broadway). Sempre com grande sucesso, e muitas vezes em reportório shakespeariano. Ganhou Tonys pelas participações em “Does a Tiger Wear a Necktie?” (1969) e “The Basic Training of Pavlo Hummel” (1977). Estreia-se como realizador com “The Local Stigmatic”, nunca concluído, continuando depois com dois títulos extremamente interessantes, “Looking for Richard” e “Chinese Coffee”.


Filmografia:
No cinema: 1969: Me, Natalie (Sou eu, a Natália), de Fred Coe; 1971: The Panic in Needle Park (Pânico em Needle Park), de Jerry Schatzberg; 1972: The Godfather (O Padrinho), de Francis Ford Coppola; 1973: Scarecrow (O Espantalho) de Jerry Schatzberg; 1973: Serpico (Serpico), de Sidney Lumet; 1974: The Godfather Part II (O Padrinho, Part II), de Francis Ford Coppola; 1975: Dog Day Afternoon (Um Dia de Cão), de Sidney Lumet; 1977: Bobby Deerfield (Bobby Deerfield, Um Momento, Uma Vida), de Sydney Pollack; 1979: And Justice for All (...E Justiça para Todos), de Norman Jewison; 1980: Cruising (A Caça), de William Friedkin; 1982: Author! Author! (O Palco e a Vida), de Arthur Hiller; 1983: Scarface (Scarface - A Força do Poder), de Brian De Palma; 1985: Revolution (Revolução), de Hugh Hudson; 1989: Sea of Love (Perigosa Sedução), de Harold Becker; 1990: Dick Tracy (Dick Tracy), de Warren Beatty; The Godfather Part III (O Padrinho, Parte III) de Francis Ford Coppola; 1991: Frankie and Johnny (Frankie e Johnny), de Garry Marshall; 1992: Glengarry Glen Ross (Sucesso a Qualquer Preço), de James Foley; Scent of a Woman (Perfume de Mulher), de Martin Brest; 1993: Carlito's Way (Perseguido Pelo Passado) de Brian De Palma; 1995: Heat (Heat - Cidade Sob Pressão), de Michael Mann; 1996: City Hall (A Sombra da Corrupção), de Harold Becker; Looking for Richard (À Procura de Richard), de Al Pacino; 1997: Donnie Brasco (Donnie Brasco), de Mike Newell; Devil's Advocate (O Advogado do Diabo) de Taylor Hackford; 1999: The Insider (O Informador), de Michael Mann; Any Given Sunday (Um Domingo Qualquer) de Oliver Stone; 2000: Chinese Coffee de Al Pacino; 2002: Insomnia (Insónia), de Christopher Nolan; S1m0ne (Simone), de Andrew Niccol; 2003: The Recruit (O Recruta), de Roger Donaldson; 2004: The Merchant of Venice (O Mercador de Veneza), de Michael Radford;2007: 88 Minutes (88 Minutos), de Jon Avnet; 2007: Ocean's Thirteen (Ocean's Thirteen), de Steven Soderbergh; 2008: Righteous Kill (A Dupla Face da Lei), de Jon Avnet; 2011: Wilde Salome (Salomé), de Al Pacino; 2013: Stand Up Guys (Gangsters da Velha Guarda) de Fisher Stevens; 2015: The Humbling (A Humilhação), de Barry Levinson; 2015: Danny Collins (Danny Collins - Nunca é Tarde), de Dan Fogelman; 2016: Misconduct (Misconduct - Jogos Perigosos) de Shintaro Shimosawa; 2017: Where the White Man Runs Away, de Bryan Buckley; 2018: The Irishman, de Martin Scorsese (em preparação). 
Televisão: 2003: Angels in America, de Mike Nichols; 2010: You Don't Know Jack, de Barry Levinson; 2013: Phil Spector, de David Mamet. 

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